Traremos
aqui alguns esclarecimentos sobre a relação entre escola e democracia, no
tocante ao cumprimento da função social do ensino. A partir dessas ideias,
afirma-se que Democracia e Educação são dois termos articulados entre si,
entretanto, a Democracia será tratada como valor (algo importante e em que se
acredita) e como processo (algo que se vive e é produto do que fazemos).
A
partir da relação entre a maneira que a Democracia interfere na Educação e como
o conhecimento escolar contribui para a Democracia, discutiremos a gestão
democrática e a função social da escola.
Vamos
ao tema a partir do texto a seguir.
Mãos
dadas
Carlos
Drummond de Andrade
Não
serei o poeta de um mundo caduco.
Também
não cantarei o mundo futuro.
Estou
preso à vida e olho meus companheiros
Estão
taciturnos, mas nutrem grandes esperanças.
Entre
eles, considere a enorme realidade.
O
presente é tão grande, não nos afastemos.
Não
nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não
serei o cantor de uma mulher, de uma história.
Não
direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na janela.
Não
distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida.
Não
fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins.
O
tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens
presentes,
a vida presente.
Tal
poema nos leva a refletir sobre o significado da Democracia em nossa sociedade.
Entre
o povo brasileiro, a Democracia é um valor consensual e é apontada na
Constituição Federal e em outras leis, dentre elas as educacionais.
Grosso
modo, pode ser definida como a forma de organização política em que os cidadãos
elegem representantes (Democracia representativa para cargos majoritários no
Executivo (presidente, governadores, prefeitos) e no Legislativo (senadores,
deputados e vereadores) para governar em prol da maioria).
Sacristán
(1999, p. 57) traz uma interessante definição:
“Um conjunto de
procedimentos para poder conviver racionalmente, dotando de sentido uma
sociedade cujo destino é aberto, porque acima do poder soberano do povo já não
há nenhum poder. São cidadãos livres que determinam a si mesmos como indivíduos
e coletivamente.”
Vamos agora à relação entre Educação e Democracia.
Para a Democracia, é possível uma vida melhor a
todos independentemente de condição social, raça, religião e sexo. Homens,
mulheres, crianças e jovens vivem melhor por meio da convivência com seus
iguais (socialização) e do acesso aos bens culturais, e a escola é o lugar que
permite a convivência e o contato com esses bens. A Democracia e a Educação não
se separam e representam a busca individual e coletiva do que queremos
ser.
Os aspectos de valor e de processo da Democracia não se separam, pois o
valor refere-se àquilo que tem importância para as pessoas e formas de
organização da vida coletiva, e a sociedade busca maneiras para assegurá-lo.
Por esse motivo, se afirma que ela, a Democracia, não é algo dado, mas um
processo em permanente construção assegurado principalmente pela eleição.
Democracia como valor na Legislação Brasileira
Vejamos agora o que diz a Constituição Federal de 1988:
TÍTULO I
Dos Princípios Fundamentais
Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada
pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,
constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a
dignidade da pessoa humana;
IV- os
valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o
pluralismo político.
Parágrafo
único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes
eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Obs.: veja que
a Democracia é um valor eleito no documento mais
importante do país.
Também nesse
documento consta, no Capítulo III, que trata “Da Educação, Da Cultura e Do
Desporto”, o princípio da “gestão democrática do
ensino público, na forma da lei” (art. 206, inciso VI), que nos permite
associar a ideia de Democracia com Educação. O primeiro princípio do artigo 206 afirma “igualdade
de condições para o acesso e a permanência na escola (inciso I)”.
Na
Constituição Federal, também denominada Carta Magna, encontramos o princípio de
que todos,
independentemente de origem, raça, sexo, idade ou confissão religiosa, possuem
os mesmos direitos perante a lei.
Os dois princípios também são
encontrados na LD de 1996, conforme o recorte a seguir:
TÍTULO
II
Dos
Princípios e Fins da Educação Nacional
Art. 3º. O
ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I -
igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
[...]
VIII
- gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação
dos sistemas de ensino;
Esse último inciso mencionado indica o entendimento
que compete aos órgãos normativos dos estados e municípios garantir do referido
princípio.
Também encontramos no TÍTULO IV da LDB 9394/96, que
trata Da Organização da Educação Nacional, o Art. 14º: “Os
sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público
na educação básica...”
A democracia como valor, como vimos,
faz parte da legislação do Brasil, e é indicada tanto nos princípios gerais da
Constituição de 1988 quanto nos que se referem especificamente à educação,
contidos na LDB, como percebemos anteriormente.
Democracia como processo
Nesse aspecto, ela é construída nas relações
cotidianas e resulta do trabalho coletivo realizado na escola, por meio da
participação dos envolvidos no processo.
Assim, a escola vivencia a Democracia como processo por meio de
mecanismos de participação. Por exemplo: os Conselhos de Classe e de Escola,
quando atuantes de fato, permitem a tomada de decisões coletivas.
A escola e a Democracia
A escola cumpre importante papel, pois assegura a
todos a igualdade de condições e a permanência bem-sucedida em seus espaços.
Vale lembrar que tanto a Constituição de 1988 quanto a LDB 9394/96 elegem a
gestão democrática como princípio básico de organização do ensino público.
A escola, depois da família, é instrumento para
exercer a Democracia como valor e como processo, e permite o início da
socialização entre as pessoas, por meio da convivência. Crianças e jovens
aprendem tanto limites quanto seu direito individual em relação ao direito
do(s) outro(s). Entre o eu e o(s) outro(s) existe um nós:
princípio básico da convivência humana.
Resta ainda lembrar que as palavras expressam os valores democráticos,
mas são os atos e vivências que expressam seus processos. Por esse motivo,
sempre devemos caminhar de mãos dadas, como diz o poema, de modo a concretizar
uma gestão comprometida com o sucesso das crianças e jovens que frequentam os
espaços escolares.
Referências
DOURADO, Luiz Fernandes. Progestão:
como promover, articular e envolver a ação das pessoas no processo de gestão
escolar. Módulo II. MACHADO, Maria Aglaê de Medeiros (coord.). Brasília: CONSED
– Conselho Nacional de Secretários de Educação, s/d.
SACRISTÁN, J. G. Poderes instáveis em
Educação. NEVES, Beatriz Afonso (trad.). Porto Alegre: Artes Médicas Sul,
1999.