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segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

ESCOLA E DEMOCRACIA - E A FUNÇÃO SOCIAL DO ENSINO

Traremos aqui alguns esclarecimentos sobre a relação entre escola e democracia, no tocante ao cumprimento da função social do ensino. A partir dessas ideias, afirma-se que Democracia e Educação são dois termos articulados entre si, entretanto, a Democracia será tratada como valor (algo importante e em que se acredita) e como processo (algo que se vive e é produto do que fazemos).
A partir da relação entre a maneira que a Democracia interfere na Educação e como o conhecimento escolar contribui para a Democracia, discutiremos a gestão democrática e a função social da escola.
Vamos ao tema a partir do texto a seguir.
Mãos dadas
Carlos Drummond de Andrade
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros
Estão taciturnos, mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considere a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história.
Não direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na janela.
Não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida.
Não fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens
presentes, a vida presente.
Tal poema nos leva a refletir sobre o significado da Democracia em nossa sociedade.
Entre o povo brasileiro, a Democracia é um valor consensual e é apontada na Constituição Federal e em outras leis, dentre elas as educacionais.
Grosso modo, pode ser definida como a forma de organização política em que os cidadãos elegem representantes (Democracia representativa para cargos majoritários no Executivo (presidente, governadores, prefeitos) e no Legislativo (senadores, deputados e vereadores) para governar em prol da maioria).
Sacristán (1999, p. 57) traz uma interessante definição:
“Um conjunto de procedimentos para poder conviver racionalmente, dotando de sentido uma sociedade cujo destino é aberto, porque acima do poder soberano do povo já não há nenhum poder. São cidadãos livres que determinam a si mesmos como indivíduos e coletivamente.”

Vamos agora à relação entre Educação e Democracia.
Para a Democracia, é possível uma vida melhor a todos independentemente de condição social, raça, religião e sexo. Homens, mulheres, crianças e jovens vivem melhor por meio da convivência com seus iguais (socialização) e do acesso aos bens culturais, e a escola é o lugar que permite a convivência e o contato com esses bens. A Democracia e a Educação não se separam e representam a busca individual e coletiva do que queremos ser.
Os aspectos de valor e de processo da Democracia não se separam, pois o valor refere-se àquilo que tem importância para as pessoas e formas de organização da vida coletiva, e a sociedade busca maneiras para assegurá-lo. Por esse motivo, se afirma que ela, a Democracia, não é algo dado, mas um processo em permanente construção assegurado principalmente pela eleição.
Democracia como valor na Legislação Brasileira
Vejamos agora o que diz a Constituição Federal de 1988:
TÍTULO I
Dos Princípios Fundamentais
Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV- os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Obs.: veja que a Democracia é um valor eleito no documento mais importante do país.
Também nesse documento consta, no Capítulo III, que trata “Da Educação, Da Cultura e Do Desporto”, o princípio da “gestão democrática do ensino público, na forma da lei” (art. 206, inciso VI), que nos permite associar a ideia de Democracia com Educação. O primeiro princípio do artigo 206 afirma “igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola (inciso I)”.
Na Constituição Federal, também denominada Carta Magna, encontramos o princípio de que todos, independentemente de origem, raça, sexo, idade ou confissão religiosa, possuem os mesmos direitos perante a lei.
Os dois princípios também são encontrados na LD de 1996, conforme o recorte a seguir:
TÍTULO II
Dos Princípios e Fins da Educação Nacional
Art. 3º. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
[...]
VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino;
Esse último inciso mencionado indica o entendimento que compete aos órgãos normativos dos estados e municípios garantir do referido princípio.
Também encontramos no TÍTULO IV da LDB 9394/96, que trata Da Organização da Educação Nacional, o Art. 14º: “Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica...”
A democracia como valor, como vimos, faz parte da legislação do Brasil, e é indicada tanto nos princípios gerais da Constituição de 1988 quanto nos que se referem especificamente à educação, contidos na LDB, como percebemos anteriormente.
Democracia como processo
Nesse aspecto, ela é construída nas relações cotidianas e resulta do trabalho coletivo realizado na escola, por meio da participação dos envolvidos no processo.
Assim, a escola vivencia a Democracia como processo por meio de mecanismos de participação. Por exemplo: os Conselhos de Classe e de Escola, quando atuantes de fato, permitem a tomada de decisões coletivas.
A escola e a Democracia
A escola cumpre importante papel, pois assegura a todos a igualdade de condições e a permanência bem-sucedida em seus espaços. Vale lembrar que tanto a Constituição de 1988 quanto a LDB 9394/96 elegem a gestão democrática como princípio básico de organização do ensino público.
A escola, depois da família, é instrumento para exercer a Democracia como valor e como processo, e permite o início da socialização entre as pessoas, por meio da convivência. Crianças e jovens aprendem tanto limites quanto seu direito individual em relação ao direito do(s) outro(s). Entre o eu e o(s) outro(s) existe um nós: princípio básico da convivência humana.
Resta ainda lembrar que as palavras expressam os valores democráticos, mas são os atos e vivências que expressam seus processos. Por esse motivo, sempre devemos caminhar de mãos dadas, como diz o poema, de modo a concretizar uma gestão comprometida com o sucesso das crianças e jovens que frequentam os espaços escolares.

Referências
DOURADO, Luiz Fernandes. Progestão: como promover, articular e envolver a ação das pessoas no processo de gestão escolar. Módulo II. MACHADO, Maria Aglaê de Medeiros (coord.). Brasília: CONSED – Conselho Nacional de Secretários de Educação, s/d.
SACRISTÁN, J. G. Poderes instáveis em Educação. NEVES, Beatriz Afonso (trad.). Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.